No interior do Brasil, um movimento silencioso vem ganhando força — e ele não depende de São Paulo ou Rio de Janeiro. Em cidades como Rolante (RS), com apenas 21 mil habitantes, o uso de criptomoedas, popularmente chamadas de “cripto”, já faz parte do dia a dia. Estabelecimentos aceitam pagamento em Bitcoin como se fosse cartão de débito, com direito a padarias, farmácias, mercados… e até um curioso estabelecimento que estampa a frase “crazy time ao vivo? Aqui também aceitamos satoshis”.
Rolante conquistou o título de “maior cidade Bitcoin do mundo” em 2024, graças ao projeto comunitário “Bitcoin é Aqui!”, que mobilizou 194 comércios locais. Superou até El Salvador, onde o BTC é moeda oficial. Porto Alegre não ficou para trás: com o projeto Go BTC, 102 estabelecimentos da capital gaúcha já aceitam pagamentos com cripto — de vinícolas a farmácias. Tudo funcionando com Lightning Network e treinamento para empresários.
O que chama atenção é a naturalidade. Não há marketing exagerado nem promessas utópicas — só gente comum fazendo transações do jeito que preferem. E isso inclui turistas: Santo Antônio do Pinhal (SP), com 23 pontos de venda, virou parada obrigatória para quem quer tomar um café ou pagar a pousada com cripto na “Montanha Bitcoin”.
No mapa global do BTC Map, duas cidades brasileiras ocupam o topo. A revolução, pelo visto, não começou nas capitais — mas sim em ruas estreitas, ladeiras tranquilas e comunidades bem organizadas.
Capitais Que Estão Moldando o Mercado
Nos grandes centros, o ritmo é outro — mas o impacto, gigantesco. São Paulo, por exemplo, responde por mais de 35% das declarações de cripto à Receita Federal. Nada mais natural: startups, exchanges e eventos como o BitSampa brotam por todos os lados. A prefeitura, inclusive, já publicou decreto facilitando testes com blockchain em serviços públicos. A meta? Se tornar hub de inovação regulada.
O Rio de Janeiro tentou ir ainda mais longe. Em 2023, anunciou que o IPTU poderia ser pago com Bitcoin (por meio de intermediários). A implementação atrasou, mas o recado foi claro: há espaço para cripto na gestão pública. A cidade criou grupo de trabalho, lançou NFTs oficiais e hoje recebe eventos como a Ethereum.Rio. A movimentação atraiu empresas — e uma nova geração de profissionais cripto.
Florianópolis ganhou apelido: “Ilha do Bitcoin”. Por lá, a combinação de energia mais barata, alto número de entusiastas e mineradores informais criou uma comunidade ativa. Curitiba segue no mesmo embalo — com apoio da universidade local, meetups regulares e estabelecimentos que já aceitam cripto desde 2021.
Fora do eixo Sul-Sudeste, remessas internacionais explicam o crescimento do uso de cripto em Fortaleza e Recife. Com muitos moradores recebendo ajuda do exterior, stablecoins como USDT passaram a substituir opções tradicionais como Western Union. O resultado? Uma adoção per capita que surpreende, mesmo sem alarde.
Belo Horizonte, com seu ecossistema tech consolidado, também entra nesse radar. Não lidera o número de comércios, mas concentra investidores, empresas e debates regulatórios. Ou seja: enquanto o interior transforma o comércio de rua, as capitais cuidam da estrutura — regulatória, empresarial e tecnológica — que sustenta a expansão nacional.
Cripto Além do Eixo Financeiro
A adoção de cripto no Brasil deixou de ser exclusividade das grandes capitais. Em várias cidades médias — e até em zonas rurais — a tecnologia já está presente no cotidiano. Em muitos desses lugares, o uso não vem de hype, mas de necessidade prática.
No Nordeste, por exemplo, stablecoins viraram uma alternativa mais direta e barata a serviços como Western Union. Em Fortaleza e Recife, o envio de remessas do exterior ganhou novo formato: familiares recebem ajuda financeira direto em USDT, sem pagar taxas absurdas ou enfrentar filas. O celular virou ponte entre países — e entre moedas.
A disseminação, no entanto, não se limita ao uso pessoal. Em bairros afastados e cidades turísticas, comerciantes locais também começaram a aceitar criptomoedas. Por quê? Menos burocracia. Com ajuda de workshops, meetups e vídeos online, até prestadores de serviço aprenderam a operar uma wallet. O conhecimento está deixando de ser técnico — e virando cotidiano.
Esse movimento não tem um único rosto. É feito por cabeleireiras, vendedores ambulantes, pequenos hotéis e motoristas. E isso mostra algo importante: o crescimento da criptoeconomia brasileira é capilar, não concentrado. Sai do centro e se espalha — sem pedir licença.
Quando a Placa Diz “Bitcoin Aceito”
Não é mais coisa de documentário. Em várias cidades do país, já é possível caminhar por uma rua e ver na porta: Bitcoin accepted. Do sertão nordestino ao sul do país, essas placas deixaram de ser exóticas — e viraram parte do comércio real.
O que parecia improvável virou prática. Cafés, pousadas, lojinhas e até postos de gasolina já operam com cripto. Muitas vezes, aceitam satoshis, pequenas frações de Bitcoin, como se fosse o troco do dia. E quando o pagamento chega, é instantâneo — direto na carteira digital. Simples assim.
Em 2025, o Brasil já soma mais de 11 milhões de usuários cripto. E não estamos falando só de traders com apps no celular. Estamos falando de gente comum — que paga um pão de queijo com cripto ou recebe um hóspede que prefere usar USDT. A criptoeconomia está ganhando rosto, sotaque, rotina.
Essa mudança tem cheiro de café recém-passado e barulho de máquina de cartão. Mas no lugar do chip, vem um QR Code. Parece detalhe, mas é sintoma de algo maior: uma economia que começa a falar outra língua — uma que não depende de bancos, nem de horário comercial.